O desempenho da economia mundial neste ano deverá ser melhor do que se antecipava apenas alguns meses atrás, a despeito dos desequilíbrios fiscais agravados pela crise de 2008, especialmente (mas não exclusivamente) em alguns países periféricos da Europa.
O próprio FMI, em seu World Economic Outlook recém divulgado, revisou de 3,9% para 4,2% a projeção de crescimento mundial em 2010, como resultado das excepcionais taxas de crescimento dos grandes países asiáticos (China 10% e Índia 8,8%), mas também da recuperação dos EUA (3,1%) e do mundo emergente em geral. A despeito disso, deve-se notar que as economias desenvolvidas ainda carregarão para os próximos dois anos, pelo menos, um grau elevado de ociosidade de fatores de produção, em particular de mão-de-obra.
A consistente recuperação pós-crise, no entanto, não deve nos fazer esquecer da complexa agenda econômica ainda em aberto, na qual pelo menos três grandes questões se destacam: a retirada dos estímulos monetários e fiscais criados durante a crise, o retorno das taxas de juro para seus níveis normais e o reequilíbrio fiscal no mundo desenvolvido1. Em particular, ainda não está claro o curso da política fiscal nos EUA, no
Japão e na Europa, em face da necessidade de estabilizar (e mesmo reduzir, em muitos casos) a relação entre a dívida pública e o PIB para manter sustentabilidade fiscal.
Sem dúvida, o problema mais urgente é a deterioração fiscal aguda de alguns países europeus, que transitaram para uma situação de não sustentabilidade da dívida pública a partir de 2009. Emblemática é a posição da Grécia, para a qual se estima ser necessário
reverter um déficit primário do governo de 4% do PIB em 2009 para um superávit primário de 6% do PIB a partir de 2010-11 apenas para readquirir sustentabilidade (manter a relação dívida/PIB constante). Para se avaliar a dificuldade política e social de tal ajustamento, basta dizer que, segundo se estima, um ajuste fiscal da ordem de 10
pontos de percentagem do PIB levaria a uma queda do PIB próxima de 25%2. A
expectativa de que tal ajuste não pode ser feito pelo governo levanta a possibilidade concreta de que alguma forma de reestruturação de dívida será necessária, com a conseqüente perda de capital dos credores da dívida grega, em grande parte domiciliada no exterior.
Um paralelo interessante tem sido feito entre a situação da Grécia em 2010 e da Argentina em 2001. A iminência da moratória argentina fez com que o prêmio de risco daquele país se desgarrasse do EMBI médio dos demais emergentes a partir de meados de 2001, com efeito relativamente pequeno sobre os demais países, inclusive o Brasil.
Apesar da grande dimensão do default (mais de US$ 100 bilhões), o mercado
internacional “isolou” o problema argentino e continuou a funcionar normalmente para os demais países, ou seja, o efeito de contágio da moratória foi bastante limitado. A razão fundamental, na época, foi o fato de que os demais países emergentes estavam longe da zona de risco. É possível que fenômeno semelhante ocorra agora: uma eventual
reestruturação da dívida grega, especialmente se for acompanhada de um programa de ajustamento negociado com o FMI e a União Européia, não afete substancialmente a liquidez internacional e não seja um obstáculo à continuidade da recuperação em todo o mundo. Nesse contexto, medidas fortes de ajustamento fiscal nos outros países europeus em situação de vulnerabilidade serão vitais para limitar o contágio.
Nossa visão continua a ser moderadamente otimista para a recuperação da economia mundial. Os problemas fiscais decorrentes das crises financeiras são bem conhecidos na história moderna e, apesar de sua gravidade e extensão, não há muita coisa nova no diagnóstico da crise de 2008 e nos remédios que devem ser aplicados pelos governos.
Para o Brasil, fica uma lição importante: descontrole fiscal é fácil de fazer, mas muito difícil de reverter.
Finalmente, é importante mencionar que apesar dessa visão relativamente otimista quanto ao crescimento da economia mundial, não podemos deixar de reconhecer que os problemas acima mencionados deverão provocar volatilidade nos mercados e são ainda óbices para uma firme recuperação dos preços dos ativos, especialmente das ações.
terça-feira, 27 de abril de 2010
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